domingo, 23 de junho de 2013

PELA LIBERDADE DE EXPRESSÃO EM BUSCA DO BEM PÚBLICO E DA HUMANIZAÇÃO DA VIDA


“Uma simples faísca pode incendiar a cidade”



ALEXANDRE ARAGÃO DE ALBUQUERQUE




Na quinta-feira 13 boa parte do país foi tomado de surpresa pela cobertura que a mídia global fazia da manifestação de alguns jovens pelas ruas de São Paulo no seu legítimo e democrático direito de manifestar-se contra o aumento das passagens de ônibus.


Essa mídia global, de forma orquestrada, imediatamente tratou de caracterizar aquela manifestação buscando enquadrar o Movimento Passe Livre (MPL) como um grupelho extremista. Entretanto, a ação truculenta da Polícia Militar (PM) paulista naquela noite chamou a atenção da população e foi a gota d’água para despertar a população em favor dos jovens manifestantes, atraindo, como efeito viral, uma massa avassaladora para às ruas.


Papel importante para o desvelamento da verdade foi desempenhado pelas redes sociais e smartphones para derrubar as distorções construídas pela mídia global conservadora – que é especialista em mostrar apenas o seu lado de visão de um fenômeno e tenta-lo impor como verdade única, neste caso ao buscar enquadrar aquela manifestação como extremista e baderneira.


Os jovens – como também os adultos que os acompanhavam – decidiram ocupar o espaço público por uma questão óbvia: o direito inalienável da liberdade de se manifestar. O espaço público é de todos e deve estar a serviço de todos. Eis a primeira questão que emerge como ponto fundamental para nossa reflexão, resultado dessas manifestações das quais estamos um tanto desacostumados.

Para o mundo desigual concebido pelo neoliberalismo do Estado mínimo que produz a volta ao estado de natureza do cada um por si e todos contra todos, onde vence o mais forte economicamente e danem-se os fracos, são priorizados os paraísos privados de compras, os assim chamados shoppings centers, os condomínios fechados, os carros blindados, a saúde privatizada, em detrimento do bem público. Os seguidores dessa ideologia política têm o Mercado como único fundamento de ordenação e orientação social, e desta forma mantêm-se distantes e alheios à construção de uma sociedade mais equilibrada e sustentável.

Os espaços públicos que deveriam servir a todos acabam paulatinamente sendo privatizados em nome do progresso. E os problemas das metrópoles, em todo mundo, cada vez mais se agravam abertamente: dificuldades de mobilidade pelo incentivo à compra do automóvel em detrimento do investimento no transporte público de qualidade; deterioração de bairros e territórios inteiros em nome da especulação imobiliária; enfim, ausência de políticas públicas de qualidade que contemplem a população como um todo, principalmente aquela parte que mais necessita dessas políticas.

Importante lembrar que esse tipo de manifestação da juventude só foi possível porque estamos no regime democrático, e o que seria a democracia?

Podemos dizer que a democracia moderna é, antes de tudo, o reconhecimento que a humanidade faz de si mesma, percebendo que pessoas e coletividades são capazes de ser agentes de suas histórias, como sujeitos livres e iguais, tendo o direito de agir na qualidade de criadores de suas vidas individual e coletiva, exercendo sua liberdade positiva, e não somente tendo o direito de lutar para serem libertados dos grilhões que os aprisionam, pela limitação do poder político ou econômico, a assim chamada liberdade negativa.

Um dos eixos centrais da democracia é a soberania popular, a afirmação de que a ordem política é produzida pela ação humana.

Por consequência temos que viver democraticamente requer não apenas saber das próprias razões e projetos pessoais, fechando-se neles. É preciso aprender a conhecer as razões do outro, uma vez que a dimensão comum componente de uma cultura e uma vida democrática requer visões e responsabilidades compartilhadas.

No caso específico da juventude, ela requer a existência de estruturas adequadas para o seu desenvolvimento integral, para suas buscas e inovações, para a formulação dos projetos e de suas inserções na vida política, social, cultural e econômica, que levem em conta as diversidades entre as pessoas, bem como as desigualdades de classe, gênero, etnia, condição de moradia, localização entre centro e periferia: em função destas diferenças, os recursos disponíveis pelas políticas públicas resultam em chances muito distintas de desenvolvimento e inserção para os jovens.

E como atesta Paulo Freire, com a experiência desumanizadora da pobreza e da carência, os movimentos sociais - neste caso, o movimento de juventudes -  fazem resistência e incentivo para formação de valores e ação política. É a pedagogia de reagir às limitações impostas à existência pelos modelos de produção e reprodução da vida humana, para estabelecer processos de humanização.

A experiência de viver sob desigualdades sociais e econômicas é uma matriz formadora de processos de humanização com base na consciência da desumanização a que se está submetido.

Tomar consciência, segundo Freire, é um processo que só existe quando não apenas reconhecemos, mas experimentamos a dialeticidade entre objetividade e subjetividade, entre prática e teoria. A conscientização não pode parar na etapa do desvelamento da realidade: a sua autenticidade acontece quando a prática do desvelamento da realidade constitui uma unidade dinâmica e dialética com a prática da transformação da realidade, situando os sujeitos em processo de elaboração de suas cidadanias. A cidadania para Freire é essencialmente uma transformação continua da realidade na busca coletiva da humanização.

As manifestações recentes vêm demonstrar que estamos apenas no começo.






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