sábado, 16 de fevereiro de 2013

O Valor da Renúncia

Alexandre Aragão de Albuquerque


No cancioneiro popular brasileiro encontramos verdadeiras maravilhas que exprimem com grande sensibilidade a realidade humana a partir de diversas perspectivas existenciais captadas pelo espírito de compositores geniais em sua forma de poetizar.

Nélson Gonçalves, gaúcho de Santana do Livramento, antes de ser o cantor que mais vendeu discos no Brasil, com 75 milhões de cópias vendidas, ficando atrás apenas de Roberto Carlos e Tonico &Tinoco, foi jornaleiro, mecânico, engraxate, lutador de boxe. Conheceu muitas faces da vida.

Em 1942, estorou nas paradas com o sucesso Renúncia, composição de Roberto Martins e Mário Rossi. O verso forte que conclui esta canção é: “Difícil no amor é saber renunciar”.

No dicionário Houaiss da Língua Portuguesa vamos encontrar significados para o vocábulo renúncia como sendo o abandono do direito por seu titular; ato pelo qual a pessoa abdica de vantagens; ato de desprendimento. Na raiz desta palavra está o substantivo feminino núncia que significa o ato de prognosticar uma situação futura, um prenúncio.

A renúncia contém, portanto, o desapego do tempo presente em função de uma visão de futuro. De fato, só sabe o custo e o valor de uma renúncia quem a vivenciou com tal magnitude.

Há quem renuncie a uma paixão. Por amor ao ser amado, percebendo-se que, não obstante o calor que os une seja incendiador, os desencontros manifestos no relacionamento são complicadores para a construção de um futuro sustentável e feliz entre os dois. Assim, por amor ao outro, renuncia-se ao fogo presente, uma vez que as diferenças concretas vividas na relação apontam claramente para um futuro infeliz. É preciso coragem, honestidade e sensibilidade para tomar tal decisão. Desapego e fidelidade à visão contemplada.

Há quem renuncie a uma missão. Apesar de saber-se capaz de seguir adiante e fiel ao mandato que lhe foi confiado, o contexto histórico lhe é adverso, pelas visões arcaicas e fundamentalistas que persistem em querer resistir às inovações necessárias para que o ideal de vida se atualize e continue com sua capacidade de encantar e atrair pessoas e grupos sempre mais conscientes da obra a ser construída no dia a dia.

Assim, pela reflexão repetidas vezes realizada no interior mais íntimo da consciência, vê-se que a única atitude a ser tomada é a renúncia, para o bem de todos, como um alerta e manifestação pública da experiência que está sendo vivida. Renuncia-se a si mesmo, aos seus talentos, às suas potencialidades, aos “dons” recebidos para justamente serem colocados para o bem comum. Renuncia-se a tudo isso com a esperança de que, com a renúncia, os outros passem a enxergar a realidade sem a confusão fundamentalista que cerca suas mentes.

Difícil no amor é saber renunciar.

Há quem o faça por amor e há quem o faça sendo o amor.


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